terça-feira, 15 de setembro de 2009

O mudo fofoqueiro


No pequeno município de Nazaré das Contas, como em todo interiorzinho do nordeste, a vida dos outros é a principal ocupação da população. Fofoqueiros e fofoqueiras de plantão passam o dia todo à espreita de “novidades alheias” para virar assunto nas rodas de conversa. É aquela vizinha saidinha demais da conta, é a filha da comadre que anda de fornicação com o namorado, é o filho do compadre que é baitola. Tudo é do conhecimento de todos e nada fica em segredo na pequena Nazaré das Contas. Nem mesmo os detalhes mais íntimos da vida dos casais ficam entre quatro paredes. Tal situação se da por arte de um mudo muito do fofoqueiro.

Mudinho Raimundo sabe de tudo sobre cada contense, e faz questão de espalhar pra o mundo inteiro as histórias que chegam ao seu conhecimento. Certa vez o excomungado fez até um jornalzinho para falar da vida dos outros. Sua carreira de jornalista acabou quando saiu no “diário de fofocas” uma reportagem sobre Santinha, a mulher de Gorila do Brejo que é simplesmente o maior valentão de Nazaré das Contas, e o maior corno também. O homem ficou uma fera com as historias publicadas: era o padeiro, o leiteiro, o guardinha, todo mundo tinha pegado Santinha, que de santa só tem mesmo o nome. Num deu outra o gorila baixou o sarrafo no mudo e desde então ele não quis mais saber de noticias escritas. O jornal acabou por motivos de força maior: censura da braba, embaixo de pancada. Parou de publicar suas fofocas, mas não largou o oficio de jornalista da vida alheia. Se remexe, gesticula, faz até posição obscena para encenar os segredos mais íntimos. A falta da fala não atrapalha de jeito nenhum a transmissão da informação.

É um verdadeiro mistério para o povo como o mudinho Raimundo sabe de tanta coisa, tanto segredo. Há quem diga que ele é vidente, há quem diga até que ele tem parte com o demo. Volta e meia toma uns safanões por cima da cara, de cabra que quer saber como ele fica sabendo dos causos. Mas como todo bom jornalista nem sob tortura revela as fontes.

Se você achou curioso o caso de um mudo fofoqueiro, imagine só que coisa; mais fofoqueiro que o mudo é o padre Venâncio da paróquia de Nazaré das Contas. O pároco é quem conta tudo para o nosso jornalista sem fala, num pode ouvir uma confissão de um fiel que vai logo contar para o excomungado. Como não pode revelar para ninguém a confissão, ele não resiste e conta para Raimundo na inocência de que este por não falar, vai guardar segredo. Depois de contar uma história sobre alguém o padre sempre fala “olha lá! Não vá me falar isso para ninguém”. É falar, falar o mudo Raimundo não fala pra ninguém.


(Por: Levi Almeida JR)

Um comentário: